Consumidores têm de ser mais exigentes para tomar melhores decisões de compra. Papel das marcas passa por dinamizar esta literacia, e por dar o exemplo no cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Estas são algumas das conclusões da conferência ‘Parar para Pensar: Sustentabilidade’, uma iniciativa da Deco Proteste a que o Expresso se associou, e que decorreu esta tarde em Lisboa
A mudança é inevitável e urgente. Tornar o mundo mais sustentável obriga a uma transformação da sociedade, das empresas e dos governos que tarda, apesar da meta definida pela Organização das Nações Unidas (ONU), em 2015, apontar para 2030. Seriam 15 anos de trabalho intenso que agora, a meio caminho, parecem não ser suficientes para ultrapassar tantos, e tão diversos, desafios. “Será que numa década vamos conseguir fazer as pessoas mudar os seus comportamentos?”, questionou Nuno Lacasta, que abriu a conferência que esta tarde juntou um conjunto de parceiros da Deco Proteste na iniciativa ‘Dia S’, que visa dar a conhecer o Dia Nacional da Sustentabilidade. O presidente da Agência Portuguesa do Ambiente (APA) recordou que é urgente esta transformação de mentalidades e de comportamentos, num mundo em que mais de dois mil milhões de pessoas (cerca de um terço da população mundial) não tem sequer um euro por dia para viver. “Este é um dilema que temos que resolver”, disse.
Mas, abordar a sustentabilidade é um desafio que tem de ser transversal porque, como relembra Elsa Agante, “não estamos a falar apenas de ambiente”. A responsável pela equipa de energia e sustentabilidade da Deco Proteste que falava no primeiro painel da conferência, dedicado à ‘Sustentabilidade: Da Terra ao Mar’, recordou que esta temática tem de ser sempre endereçada através dos seus três pilares: ambiente, económico e social. E, nesta perspetiva, acrescenta, “temos que pensar a sustentabilidade nos 365 dias do ano”. Ou seja, as organizações têm de olhar para as suas práticas ambientais, para a sua sustentabilidade e viabilidade económica, e cuidar das suas pessoas, na vertente social.
Hoje, refere Elsa Agante, nota-se uma maior preocupação das empresas e também dos consumidores com estas questões. Segundo um estudo europeu da Deco Proteste, que cita, 66% dos consumidores está disposto a pagar mais por produtos com selo de sustentabilidade. Já em Portugal esta percentagem desce para os 25-30%, devido ao fator preço, que continua a ser muito valorizado em território nacional. Rodrigo Sengo complementa com dados de um estudo do Marine Stewardship Council (MSC) que aponta para um quarto de consumidores dispostos a pagar mais por produtos certificados na vertente da sustentabilidade. O consultor do MSC para Portugal recorda ainda que o país é o terceiro maior consumidor mundial de pescado, com cerca de 60 quilos per capita e por ano, o que torna o mercado nacional muito importante para o reconhecimento da importância da certificação da pesca. “Temos que usar o consumidor e a força do mercado para certificar a sustentabilidade na pesca, para apostar na diversidade e na pesca local”, reforça.
A caminho da cidade dos 15 minutos
O conceito, criado pelo urbanista colombiano Carlos Moreno, que defende que, numa cidade, tudo quanto é necessário no dia-a-dia dos habitantes (trabalho, escola, compras, etc..) esteja a uma distância de 15 minutos é hoje um determinante estratégico em muitos municípios em todo o mundo, e também em Portugal. No entanto, esta meta só poderá ser alcançada quando a mobilidade suave for uma realidade. Integração de transportes coletivos e privados, deslocações partilhadas, em bicicleta, trotinete ou a pé, ainda não são possíveis em grande parte do território, apesar dos esforços de empresas privadas e de instituições da administração pública local.
A mobilidade elétrica é um dos temas principais, especialmente numa altura em que a aceleração da transição energética seria desejável, quer pelos preços dos combustíveis fósseis (aumentados pela guerra na Ucrânia), quer pela necessidade ambiental. Apesar de tudo, na opinião de Rui Romano, Lisboa está ao nível das suas congéneres europeias. Mas, aponta o diretor de Rede da Cepsa, “ainda não há carregadores suficientes e apenas 30% dos portugueses têm condições de carregar os seus carros em casa”. É claro que, como salienta, há outros entraves como a autonomia que ainda não é a desejada, e os preços elevados dos carros elétricos.
Na perspetiva mais tecnológica, subjacente ao desenvolvimento de cidades inteligentes, Inês Ferreira defende que há mais oferta de serviços do que aqueles que o público em geral conhece. A diretora de produto ICT da Altice Portugal exemplifica, referindo as soluções de gestão de recolha inteligente de resíduos urbanos ou a medição de gases poluentes e de poluição sonora, que a operadora já disponibiliza em vários municípios. “O 5G vai acelerar a evolução das Smart Cities”, não duvida.
Ao longo da tarde, foram ainda abordadas temáticas como o desperdício alimentar, e o papel das marcas na consciencialização do consumidor e da sociedade para todas as temáticas que encaixam no chapéu da sustentabilidade.
Mais conclusões:
Desperdício alimentar. O retalho é um dos sectores com mais desafios a este nível e, por isso, “os selos de certificação e de sustentabilidade são essenciais para a consciência coletiva”, defende Elena Aldana. A diretora de Assuntos Públicos, Comunicação e ESG do Lidl, destaca também o peso de iniciativas que promovem o aproveitamento dos produtos, desde a venda com desconto na proximidade do fim do prazo, à entrega de produtos a pessoas com necessidades. Em 2021, revela, foram oferecidas 3300 toneladas de alimentos.
Cidades sustentáveis. Conetividade, cloud e segurança serão essenciais no desenvolvimento das Smart Cities, acredita Inês Ferreira, que reforça a importância do 5G para gerir a camada tecnológica destas cidades. Do lado da mobilidade, Rui Romano recorda a necessidade de reforçar a rede de carregamento nacional – um trabalho que a Cepsa está a fazer a nível ibérico, prevendo ter 1800 postos com carregadores ultra-rápidos em todo o território até 2024.
O papel das marcas. Ensinar os consumidores a ler de forma mais eficaz os rótulos dos produtos, e a reconhecer os selos que garantem a sua sustentabilidade é uma das missões do Lidl, e uma obrigação para todas as marcas, acredita Isa Cardoso, gestora de compras do Lidl. “Há espaço para desenvolver estas temáticas e fazer crescer a opinião pública”, acrescenta Patrícia Franganito. A gestora de certificação e formação no Bureau Veritas reforça ainda a necessidade mobilizar a sociedade, as empresas e o Estado para que possa existir uma verdadeira mudança de atitudes e comportamentos.
|Fonte: Expresso, 26 de Setembro 2022
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