Apoios: as novas linhas orientadoras e os fundos de apoio da Política Agrícola Comum entram em vigor com a chegada do novo ano. Rejuvenescer o sector é visto como imperativo

Em Portugal, a média é de três agricultores com menos de 35 anos por cada 20 com idade acima de 55
Márcia Pinto, bióloga e fundadora da Salina Greens, encaixa na maioria dos objetivos da PEPAC 2022-2027 (Plano Estratégico da Política Agrícola Comum), que entra em vigor no dia 1 de janeiro. É jovem, mulher, bióloga, a empresa que fundou em 2018 é altamente inovadora e tem na sustentabilidade e na preservação dos ecossistemas os maiores focos, apostando ainda na política de ‘desperdício zero’. A partir das salinas do Samouco, no estuário do Tejo, produz plantas halófitas que substituem o sal “100% vegetal, com elevado conteúdo em minerais e compostos bioativos com poderosa atividade antioxidante”, ao mesmo tempo que preserva a paisagem natural e o habitat de aves e plantas.
Em paralelo ao pacote de apoios do PEPAC, com uma dotação de €6713 milhões, a Comissão Europeia anunciou ainda a afetação de €185,9 milhões a atividades de promoção de produtos agroalimentares sustentáveis e de elevada qualidade. “Quem vai ao supermercado não tem noção do tempo que demora a produzir uma cenoura ou uma couve”, observa Márcia Pinto, que, apesar de corporizar o modelo que a nova PAC quer implementar (ver caixa), lamenta a dificuldade em aceder aos vários apoios: “A complexidade da burocracia e do acompanhamento do projeto dificulta muito o processo, sobretudo para uma microempresa como a nossa.”
Nas encostas da serra da Arrábida, José Maria, de 30 anos, e Maria Arriaga e Cunha, de 34, produzem queijo com leite não-pasteurizado proveniente de animais bem tratados de pastoreio, beneficiando toda a cadeia, do animal ao consumidor, passando pelo produtor. Até agora sem apoios, a empresa que criaram, a Ortodoxo, pretende candidatar-se à nova PAC com projetos ligados à transformação e inovação com base na sustentabilidade. “Há futuro na agricultura desde que saibamos o que estamos a comer”, sublinha o empresário. Justifica a afirmação com a agricultura regenerativa e circular, pela qual se rege, com respeito pelo ambiente e por quem trabalha a terra, garantindo que “pode funcionar mesmo a uma escala global”.
Rejuvenescer o sector
“Não vejo ninguém a seguir os passos dos pais”, diz Pedro Pinheiro, que tinha 39 anos quando iniciou, em 2014, a sua atividade agrícola. Contou com apoios da União Europeia para jovens agricultores, mas teve de continuar a conjugar o trabalho na terra com outra atividade profissional, a de professor de Música. Ainda hoje, passados nove anos, continua a ser impossível viver só da agricultura, garante, a partir de Avelãs de Ambom, aldeia do distrito da Guarda onde cultiva 2,5 hectares de frutos secos, entre mirtilos, amoras, framboesas e groselhas. “Os apoios chegam com condições muito específicas, que complicam ainda mais a vida, e isso desmotiva os jovens”, situação que se agudiza numa região desertificada e com graves problemas de mão de obra. Os apoios são “um mundo de oportunidades e não de facilidades”, resume José Firmino Cordeiro, diretor-geral da Associação dos Jovens Agricultores de Portugal.
A par da fixação de jovens no interior do país, a renovação geracional é um dos imperativos do novo programa de apoios, que se prolonga até 2027. Em Portugal, a média é de três agricultores com menos de 35 anos por cada 20 com idade superior a 55. Consciente destes factos, a ministra Maria do Céu Antunes insiste na mensagem: “A agricultura é produtiva, gera rendimento e valor e é sustentável.” A prioridade política é, por isso, continuar a apoiar os jovens agricultores (entre os 18 e os 40 anos) que cumpram um plano empresarial. Se investirem mais de €80 mil, a ministra da Agricultura e da Alimentação garante que terão apoios extraordinários até 75%. Uma das condições, que vale 25%, é estabelecerem-se no interior do país. “Se formos capazes de criar novas dinâmicas nesses territórios, a agricultura acompanha, naturalmente”, confia José Firmino Cordeiro. Saber valorizar o produto através da transformação e da capacidade de contar uma história é fórmula apontada para ser um jovem agricultor de sucesso. “Todos os consumidores gostam de saber o que comem, a história do produto e da própria região”, conclui.
OBJETIVOS DA PAC
As linhas orientadoras da PAC, pela primeira vez desde que foi criada, em 1962, foram elaboradas por cada um dos países-membros, de modo a adequar as necessidades sem desvirtuar as prioridades europeias, como a sustentabilidade social, ambiental e económica na agricultura e nas zonas rurais. Para Portugal, os principais objetivos são:
Atrair os jovens agricultores e facilitar o desenvolvimento das empresas nas zonas rurais e promover o emprego, o crescimento, a igualdade de género, a inclusão social e o desenvolvimento local nas zonas rurais, nomeadamente a bioeconomia e a silvicultura sustentável.
Reforçar a orientação para o mercado e aumentar a competitividade, com maior incidência na investigação, na tecnologia e na digitalização.
Apoiar os rendimentos e a resiliência das explorações agrícolas viáveis em toda a UE, de modo a reforçar a segurança alimentar.
Melhorar a posição dos agricultores na cadeia de valor.
Apoiar a proteção do ambiente e a luta contra as alterações climáticas e contribuir para a consecução dos objetivos da UE relacionados com o ambiente e o clima.
Contribuir para a adaptação às alterações climáticas e para a atenuação dos seus efeitos, bem como para a energia sustentável.
Promover o desenvolvimento sustentável e uma gestão eficiente de recursos naturais, como a água, os solos e o ar.
Reforçar o tecido socioeconómico das zonas rurais e contribuir para a proteção da biodiversidade, melhorar os serviços ligados aos ecossistemas e preservar os habitats e as paisagens.
Melhorar a resposta dada pela agricultura europeia às exigências da sociedade no domínio alimentar e da saúde, nomeadamente no que respeita à oferta de produtos alimentares seguros, nutritivos e sustentáveis, aos resíduos alimentares e ao bem-estar animal.
Futuro da PAC
Ao longo dos próximos meses, o Expresso vai discutir o futuro da Política Agrícola Comum (PAC). Como garantir o fornecimento de alimentos? Que produtos são mais sustentáveis? Em que culturas devemos apostar? Este ciclo de debates é cofinanciado pela União Europeia.
|Fonte: Expresso, 30 de Dezembro de 2021
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