É uma longa lista de produtos alimentares que nasce nos laboratórios do Politécnico, quase sempre na unidade de investigação de Peniche. O mais recente é um paté de percebes com amora, que é um antioxidante natural.
É mais um produto a juntar à já longa lista de produtos alimentares que o Instituto Politécnico de Leiria tem vindo a desenvolver nos últimos anos: o paté de percebe com amora silvestre. A invenção chegou através da unidade de investigação do MARE - Centro de Ciências do Mar e do Ambiente, em Peniche, com o objetivo maior de contribuir para a promoção e valorização gastronómica (nutricional e sensorial) do percebe (Pollicipes pollicipes), em particular do recurso capturado na Reserva Natural das Berlengas. Rui Ganhão, coordenador da licenciatura em engenharia alimentar, e investigador responsável pelo projeto, explicou ao DN que a base de toda esta ideia é tão simples como "ligar o mar à terra".
"Apesar de existir uma exploração comercial do percebe para consumo humano, os exemplares que não estão em conformidade legal ao nível do tamanho, e de acordo com os padrões de consumo na restauração, são potencialmente rejeitados e lançados ao mar por parte dos mariscadores da região", explica o docente. Depois, entra em campo o conceito de economia circular, "em que um subproduto é um recurso para outra atividade económica: pretende-se no final criar uma cadeia de valor que justifique o não desperdício do recurso através da implementação de novos processos ou a criação de novos produtos", revela Rui Ganhão.
O principal objetivo do projeto foi elaborar uma proposta inovadora na gama dos patés e cremes de barrar com uma formulação de paté adicionado com frutos vermelhos (amora silvestre), ricos em antioxidantes naturais. "Muitas vezes ligam-nos apenas aos produtos alimentares marinhos, pelo facto de estarmos em Peniche. É verdade que maioritariamente é o que temos, mas também temos outras coisas". E desta vez os investigadores tentaram "casar" dois produtos improváveis: o percebe e a amora.
Rui Ganhão é o coordenador da licenciatura em engenharia alimentar e investigador responsável pelo projeto.© DR
"Qualquer produto que eu faça tenho que lhe garantir estabilidade na prateleira do local de venda, com qualidade sensorial, nutricional e sanitária. Ora, qualquer produto transformado tem na sua composição antioxidantes. Nos últimos anos houve estudos que relataram que podia haver alguma toxicidade por parte dos mesmos, e que poderiam ser substituídos por outros, de origem natural. E foi por isso que fomos buscar um fruto silvestre como a amora", relata Rui Ganhão.
A combinação terra e mar
A proposta da equipa do MARE ao consumidor é "um alimento com carácter funcional, contribuindo para o seu bem-estar e melhorando a sua saúde, bem como gerar condições para a emergência de novas empresas direcionadas aos recursos da pesca na região Oeste". A ideia é impactar positivamente em termos sociais, económicos e ambientais, pela valorização da totalidade do volume apanhado pelos mariscadores certificados do percebe da Reserva Natural das Berlengas e que chega à Lota de Peniche. O projeto diferencia-se pela combinação do recurso marinho a um terrestre, "que resulta num apelativo e inovador produto que se pretende seja de fácil acesso com um período de vida útil extenso, comparativamente a produtos similares encontrados nas superfícies comerciais", tal como revela uma nota de imprensa do Politécnico de Leiria.
"Temos a formulação ótima do paté de percebe, enriquecido com amora silvestre, a uma concentração de 2,5%, mostrando-se mais apelativo em termos sensoriais, pela cor, aroma e textura alcançada", revela Rui Ganhão. "Para além do teor de compostos de interesse, como os fenólicos e a capacidade antioxidante, revelando-se bastante promissor na manutenção e no retardamento das reações de deterioração que habitualmente ocorrem neste tipo de produto, como a rancificação. Os produtos processados, como o paté em estudo, apresentam na sua formulação ingredientes sintéticos, como antioxidantes, para prevenir as reações de oxidação que levam à rancificação e rápida degradação/deterioração do produto", explica.
Rui Ganhão lembrou-se dos percebes mais pequenos, que não são valorizados pela restauração. "Como a legislação tem quotas, o mariscador não vai esgotar a sua quota aproveitando o percebe pequeno. Porque não é tão valorizado. E por vezes rejeitavam-nos, atirando-os ao mar. É isso que eu quero evitar. E assim colocamos a funcionar a economia circular, lançando um produto novo".
Iniciado em março de 2019, o projeto encontra-se na última fase de divulgação de resultados junto da comunidade científica e em diferentes players da fileira alimentar. A equipa de investigação é composta pelos professores investigadores Rui Ganhão, Joaquina Pinheiro, Raul Bernardino e Sérgio Leandro, e pelo bolseiro de investigação Hugo Sá. O projeto obteve o cofinanciamento do Programa Operacional Mar 2020, Portugal 2020 e Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos e das Pescas.
O domínio das algas
Nos últimos anos o Politécnico de Leiria tem dado cartas no lançamento de produtos alimentares, sobretudo criados a partir do Centro de Ciências do Mar e do Ambiente, em Peniche. Na sua maioria são produtos de origem marinha: pão de algas, pão com farinha de bivalves, gin com algas, azeite com algas, gelado de algas e kefir, almôndegas de cavala, bolachas com macroalgas, hambúrguer de cavala, hambúrgueres de salmão e de paloco. Recentemente, um aluno lembrou-se de juntar o pão de medronho. O paté de percebe com amora silvestre é a mais recente aposta.
|Fonte: DN , 04 de Janeiro 2022
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