O idealista/news foi descobrir a “nova cara” d'A Padaria Portuguesa. A decoração das lojas mudou: o foco é a portugalidade.
O negócio tradicional do pão pode reiventar-se, e prova disso é que, com o passar dos anos, foram surgindo diferentes conceitos de padarias pelo país. Exemplo disso é a Padaria Portuguesa, com mais de 50 lojas espalhadas pela Grande Lisboa e que trouxe inovação ao setor, sem descurar a tradição. Mais de uma década depois, mudou a imagem e transformou a decoração dos espaços, com uma forte aposta em materiais naturais e com origem em Portugal. Agora, os espaços “vestem-se” com a mármore de Estremoz ou a terracota trabalhada por artesãos nacionais, recuperando o espírito das antigas padarias e imaginário tradicional português. Mas não só da estética vive a mudança. A Padaria está comprometida com a sustentabilidade e economia circular, e por isso também mudou as matérias-primas e receitas.
Em termos estéticos, “e se colocarmos duas fotografias lado a lado a diferença e melhoria é gritante”, diz a diretora de marketing da marca, Rita Neto, em entrevista ao idealista/news. Mas a “mudança mais profunda”, garante, “é de paradigma”. “O foco d’A Padaria Portuguesa está em encontrar matérias-primas de maior qualidade, privilegiar a produção local (quando possível, biológica) e encontrar uma segunda vida para os dois maiores desperdícios que tem no dia a dia – borras de café e cascas de laranja – em projetos de economia circular”, explica.
"Se colocarmos duas fotografias lado a lado a diferença e melhoria é gritante (...) Mas a mudança mais profunda é de paradigma"
Rita Neto
Diretora de marketing d'A Padaria Portuguesa
Nascida Grande Lisboa, A Padaria Portuguesa está a estudar a expansão e abertura de novas lojas em outras localizações, e adotou um conceito mais sustentável. Desde o café orgânico às farinhas de moleiro, até aos ovos biológicos vindos da Serra da Estrela e lacticínios provenientes dos Açores. A mudança na oferta foi acompanhada pela remodelação dos espaços, que agora se revestem de referências do imaginário tradicional português, e peças costumizadas que foram produzidas por pequenos manufatores através de processos semi-manuais.
Além da entrevista à diretora de marketing d’A Padaria Portuguesa, o idealista/news falou com os arquitetos responsáveis pela transformação das lojas da marca, nomeadamente João Pombeiro e Carlos Aragão (este último do XXXI Studio). Reproduzímos na íntegra o que têm a contar sobre este antes e depois.
No ano em que celebra 12 anos, A Padaria Portuguesa mudou por dentro e por fora. Em que é que se baseia este reposicionamento da marca?
Rita Neto (RN): A Padaria Portuguesa mudou. Mudou matérias-primas. Mudou receitas. Mudou a identidade, a imagem e a decoração das lojas. Mudou as fardas dos colaboradores. Mudou o serviço de loiça de café. Hoje, a Padaria Portuguesa tem uma nova oferta de produtos com base em matérias-primas de maior qualidade, privilegiando a origem local e o menor impacto ambiental. As lojas foram renovadas, optando por materiais locais, como o mármore de Estremoz e o uso de terracota trabalhado por artesãos portugueses. Tem uma nova identidade gráfica, mais simples e sofisticada. E apresenta uma gama inovadora de produtos, de como são exemplos os snacks saudáveis de almoço e as novas soluções de pequeno-almoço, como os ovos mexidos biológicos, provenientes da Quinta da Caramuja na Serra da Estrela e os todos os lacticínios, que vêm dos Açores.
Se tivermos de fazer um retrato do antes e depois, quais são as grandes alterações? Novos menus? Produtos? E o layout das lojas?...
RN: Se colocarmos duas fotografias lado a lado a diferença e melhoria é gritante, mas a mudança mais profunda é de paradigma. O foco d’A Padaria Portuguesa está em encontrar matérias-primas de maior qualidade, privilegiar a produção local (quando possível, biológica) e encontrar uma segunda vida para os dois maiores desperdícios que tem no dia a dia – borras de café e cascas de laranja – em projetos de economia circular.
Lançaram uma campanha assente na pergunta “Sabe o que anda a comer?”. Qual é o objetivo?
RN: A campanha estava assente na pergunta/resposta “Sabe o que anda a comer? Dos outros não sabemos. Aqui, vai gostar de saber.” E o objetivo foi pôr os portugueses a pensar naquilo que comem fora de casa – quais as matérias-primas, a sua origem, os processos utilizados e o impacto que tudo isso tem no ambiente. Foi a maneira mais clara, direta e transparente que encontrámos para comunicar tudo aquilo que está por detrás da nova Padaria.
A marca diz estar focada na origem dos produtos e na economia circular. Em que medida?
RN: Hoje em dia privilegiamos a origem local na escolha de matérias-primas e produtos, e quando é possível produtos biológicos e com uma pequena pegada ambiental. E estamos também focados em projetos de economia circular, que transformam desperdício alimentar em novos recursos, como é o caso dos nossos dois maiores desperdícios – borras de café e cascas de laranja. Desde o ano passado que temos uma parceria com a Nãm Mushroom Farm, com a entrega das borras de café geradas todos os dias nas nossas 59 lojas, que são utilizadas na produção de cogumelos que depois usamos para fazer as deliciosas sandes e saladas que pode encontrar todos os dias aos almoços. Também temos uma parceria com a Quinta das Mélias, em Almada, que usa as nossas borras de café para fertilizante dos solos, onde estão a ser plantadas meloas que vão à estar à venda nas nossas lojas nos copos de fruta. E vamos ter muitas mais novidades sobre novos projetos em breve.
Qual é o vosso cliente tipo?
RN: A Padaria Portuguesa serve todo o tipo de clientes: desde crianças acompanhadas pelos pais a jovens que têm as nossas lojas perto dos liceus e universidades, mas também os idosos que visitam as lojas à procura de espaços para estar e conviver. Estamos nos principais bairros da cidade, mas também em zonas de escritórios e pontos de turismo, por isso a abrangência é enorme.
Quantas lojas existem atualmente? Já estão todas remodeladas? Qual o valor do investimento na nova decoração?
RN: Atualmente, A Padaria Portuguesa tem 59 lojas na Grande Lisboa, e já chegou a Setúbal há um ano. Temos 57 lojas remodeladas com este projeto de arquitetura e duas lojas de autor que se mantiveram com o seu projeto inicial – Príncipe Real, desenhada pela artista Joana Astolfi, e o LAB na Avenida da República, pelas mãos dos arquitetos Margarida Grácio Nunes e Fernando Sanchez Salvador, que é o laboratório de inovação de novos produtos da empresa.
Têm novas aberturas previstas para este ano? Se sim, onde? Que tipo de localizações privilegiam?
RN: Estamos a estudar novas localizações fora de Lisboa e quando houver novidades sobre este assunto iremos comunicá-las.
Todas as lojas são próprias ou também têm modelo de franchising?
RN: Todas as lojas são próprias, nunca tivemos modelo de franchising.
Que impacto está a ter a subida do preço das matérias-primas e da inflação no vosso negócio? Seja como compradores, seja como vendedores?
RN: Todos os dias temos informação dos nossos fornecedores sobre o aumento de matérias-primas e, claro, que isso tem impacto no negócio. Uma das matérias-primas que compramos em maior volume são os cereais e a situação mundial de crise está a afetar bastante este setor.
Uma das matérias-primas que compramos em maior volume são os cereais e a situação mundial de crise está a afetar bastante este setor
Ao fim de mais de uma década de existência, que balanço fazem do negócio?
RN: A Padaria Portuguesa faz parte da vida e do dia a dia dos lisboetas e dos turistas que visitam a nossa cidade, por isso o balanço não podia ser mais positivo. Fizemos um upgrade enorme com este novo posicionamento, que preparou a marca para os próximos 10 anos. Estamos atentos a novas tendências e ao consumidor, que é sempre o nosso foco na tomada de decisões.
A internacionalização faz parte dos vossos planos? Porquê?
RN: Para já não é uma prioridade.
Qual o conceito da nova decoração das lojas da Padaria Portuguesa?
João Pombeiro e Carlos Aragão (JP e CA): O novo conceito de interiores parte do alinhamento com aquilo que é a aposta d’ A Padaria Portuguesa nesta nova fase: o aumento de qualidade do produto, a maior utilização de produtos portugueses, a reaproximação à produção local e ao conhecimento produtivo tradicional. Nesse sentido, também nós procurámos que estas premissas se refletissem no projeto, introduzindo simplicidade no desenho e manualidade nos materiais, procurando explorar os possíveis pontos de ligação com a imagética da padaria tradicional e criando com isso um espaço mais depurado, mais confortável e no qual os produtos d’A Padaria Portuguesa ganham um maior destaque.
Em que tipo de referências do imaginário tradicional português se inspiraram?
JP e CA: Gostávamos que A Padaria Portuguesa passasse a relacionar-se visualmente mais com uma padaria tradicional do que com um café de bairro. Ao mesmo tempo, tentámos dar o máximo destaque ao produto e apagar o máximo possível de referências à marca. Há ainda algumas alusões directas ao imaginário tradicional português, como as cadeiras, que remetem para um universo tradicional de escola portuguesa reinventado, ou os tampos de pedra de Estremoz das mesas, que lembram as bancadas das antigas padarias.
Que tipos de materiais foram utilizados?
JP e CA: O foco foi usar essencialmente materiais de origem portuguesa. Daí a forte presença de mármore de Estremoz e terracota nacional.
Porquê a mármore de Estremoz ou o uso de terracota nos revestimentos de balcão?
JP e CA: Para além de serem materiais de grande resistência ao uso, são de origem portuguesa e remetem-nos para um imaginário e sentimento familiar precisamente por serem materiais que sempre fizeram parte do nosso passado.
Que outros elementos decorativos gostariam de destacar?
JP e CA: A presença de azulejos brancos no retro balcão também ajuda a destacar o produto que se apresenta nas paredes. Mais uma vez o próprio material (azulejo) faz parte da história de Portugal e traz o sentimento de conforto e reconhecimento que procuramos.
Várias peças customizadas foram produzidas por pequenos manufatores através de processos semi-manuais. Que peças foram essas?
JP e CA: Todas as peças foram produzidas por processos semi-manuais. Desde a produção de todos os elementos em terracota (candeeiros e frentes de balcão), até à customização das mesas em pedra e cadeiras produzidas no norte de Portugal.
Qual foi o grande desafio deste projeto?
JP e CA: Sem dúvida que foi o balanço entre a customização do projeto e a obrigatória “standardização” para 57 lojas.
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