Compramos demasiado, compramos mal, deixamos estragar. Não é admissível que um terço do que é produzido acabe no lixo
A presidente da Federação Portuguesa dos Bancos Alimentares Contra a Fome, Isabel Jonet, considerou intolerável e um absurdo o desperdício alimentar, com cada português a desperdiçar por ano 183 quilos de alimentos.
As declarações foram realizadas na semana passada no Dia Mundial de Consciencialização sobre Perdas e Desperdício Alimentar (29 de setembro), falando numa conferência sobre o tema, em Lisboa, a responsável lembrou as estatísticas hoje divulgadas pelo Instituto Nacional de Estatística para dizer que a situação “é pior do que se suspeitava”.
Os dados, oficiais e pela primeira vez divulgados, referem-se a 2020 e indicam que nesse ano foram desperdiçadas em Portugal 1,89 milhões de toneladas de alimentos, pelo que cada português desperdiçou em média 183,6 quilos de alimentos.
As estatísticas do INE revelam que são as famílias que mais desperdiçam. Os números indicam que mais de 1,2 milhões de toneladas de alimentos foram nesse ano desperdiçadas pelas famílias, seguindo-se a restauração, com mais de 237 mil toneladas, o comércio e distribuição, com 214 mil toneladas, a produção primária, mais de 101 mil toneladas, e a indústria alimentar, com cerca de 61 mil toneladas.
“Compramos demasiado, compramos mal, deixamos estragar. Não é admissível que um terço do que é produzido acabe no lixo”, disse a responsável, que falava num debate organizado pelo Movimento Unidos Contra do Desperdício.
Ana Cristina Carrola, da Agência Portuguesa do Ambiente (APA), que também participou no debate, salientou que a média de desperdício por ano e por habitante, na União Europeia, é de 173 quilos, abaixo dos 183 quilos que os portugueses desperdiçam.
Jorge Moreira da Silva, presidente da Plataforma para o Crescimento Sustentável, antigo ministro do Ambiente, outro dos participantes no debate, lembrou um relatório recente para dizer que o impacto do desperdício alimentar pode atingir 10% das emissões globais de gases com efeito de estufa, e que tem um impacto na economia de mil milhões dólares.
“Só o desperdício alimentar corresponde a um quarto do que é necessário para cumprir os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável”, disse, acrescentando que enquanto se deita comida pela janela há 823 milhões de pessoas que se vão deitar sem uma “refeição decente”.
Jorge Moreira da Silva referiu que há metas na União Europeia sobre redução do desperdício alimentar que não estão a ser cumpridas e que em breve serão divulgadas metas vinculativas.
Os participantes no debate coincidiram na ideia de que é preciso informar e sensibilizar as famílias, que muitas vezes desperdiçam sem ter essa consciência. “A maior parte das pessoas não faz a mínima ideia do impacto do desperdício alimentar. Ninguém muda se não tiver a noção do problema”, disse Jorge Moreira da Silva.
No debate falou-se também da importância da água, que está presente na produção e confeção de alimentos. Ana Margarida Luis, da Águas de Portugal, levou uma laranja para dizer que desperdiçar uma laranja é o equivalente a desperdiçar 80 litros de água.
Na iniciativa foram ainda divulgados outros números, que fazem parte de uma campanha de sensibilização, alertando que o desperdício alimentar gera três vezes mais emissões de gases com efeito de estufa do que a extração de petróleo, gera o equivalente a 25% da poluição automóvel, e polui quatro vezes mais do que todos os voos da aviação comercial.
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